Sinceramente cada um é um pequeno sistema planetário, um mundo cheio de complexos segredos.
No caminho rumo ao aeroporto achei melhor ir de ônibus. Parece louco preterir um taxi confortável
por um ônibus velho da linha Terminal da França -- Arembepe para depois pegar outro buzão em São Cristóvão, enfim.
Mas existe uma razão.
O lance é que no buzão eu acabo ouvindo estórias, sempre rola alguma coisa. Dessa vez acabei ouvindo a estória de um cara que teve o irmão morto pela polícia. Na verdade rolava uma conversa rolava entre esse cara do irmão morto e o cobrador do buzão.
O assunto começou na falta de espaço no cartão de memória do celular de um deles. Queriam trocar músicas via infravermelho. Leia-se pagode ao vivo.
E eu que nem sabia que existia essa subdivisão no pagode baiano. No fundo cada um se fecha no seu mundo e não sabe sobre o que acontece ao seu redor. Somos toupeiras de nós mesmos. Essa é a verdade. Além de sempre achar que o que não nos apetece, não tem valor algum.
Mas a conversa dos dois foi indo para o lance de musica evangélica, porque ambos são evangélicos. E foi nesse ponto que o cara começou a falar da vida dele, da época que ele morava na Boca do Rio , do que aconteceu com seu irmão, da vida da família dele depois do acontecido, essas coisas. Pelo que ele falou o irmão dele não tinha envolvimento nenhum com o movimento.
Nas palavras dele "No lugar errado na hora errada".
Bem legal foi na hora que le mostrou com todo orgulho as placas de madeirite que ele instalou lá na av. Paralela. Realmente eu não sei como ele fez aquilo. Umas placas imensas de compensado em pleno viaduto, com mais de três metros de altura.
O cara tava muito feliz em falar aquilo. Muita gente nem deve ver aquilo alí na avenida, provavelmente eu também não notaria se eu não tivesse tomado esse ônibus. E sempre que eu passar por alí, mesmo que aquela placa de madeira suma, vou me lembrar da estória do irmão dele e de um cara que colocou de pé, a tempos atrás, um gigantesco muro de tapumes.
E eu e monte de gente preocupado em coisas nada palpáveis.
Soltei no mesmo ponto no qual a mulher dele subiu. Acabei não falando disso, mas a esposa dele ligava constantemente esperando ele para irem rumo a Arempebe. Ele também queria que o engarrafamento fosse menor naquele dia, porque queria ainda encontrar o filhinho dele acordado. Sim ele já tem um filho e torce para que ele não seja mais um chico ou joão como ele.
Peguei outro ônibus e nele tinha um cara bêbado chamando todo mundo de corno. Todo mundo constrangido, mas acabou que todos e todas riram da situação. Se fosse em outro lugar que não Salvador, a coisa acabaria diferente.
E nesse meu mundo de check-in's infinitos faço mais um, dessa vez rumo a Natal.
Mala despachada, parada para comer um Trio de qualquer coisa sem gosto no Bob's. Apenas para passar o tempo até o avião decolar. Tento puxar o laptop para postar a estória do buzão mais fico receoso de colocar detalhes demais.
Prefiro ruminar ela mais.
Pontualmente deixo minha cidade, sem saber se o Vitória chegará ou não às finais da Copa do Brasil, se fulaninha vai me dar quando eu voltar no Sábado e se será uma boa coisa dividir o mesmo assento com meu chefe durante uma hora e vinte minutos até Natal.